Masculinidade no Brasil: o homem, de cabra macho à bode expiatório
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A masculinidade no Brasil é como em qualquer outro lugar. É impressionante o quanto alguém pode se sentir familiarizado ao ler sobre a masculinidade nos EUA, Reino Unido, Espanha, África do Sul, Coréia do Sul etc. Eu precisaria de um artigo inteiro para detalhar, mas quem já leu ou assistiu algo relacionado aos Movimentos pelos Direitos dos Homens (MDH) verá muitas similaridades com minha revisão sobre a condição dos homens no Brasil. Na verdade, O livro The Myth of the Male Power [O mito do Poder Masculino], de Warren Farrell, e O Mito da Masculinidade, de Sócrates Nolasco, são muito parecidos em alguns aspectos. A maior diferença em minha opinião é que o livro de Nolasco é mais filosófico e platônico, enquanto Farrell é mais detalhista e pragmático.
O Brasil é um país gigante, cheio de contrastes. Isso é revelado por nossa diversidade étnica e ecológica, e com a masculinidade não é diferente, indo do hipermasculino cabra macho na caatinga ao pró-feminista desconstruído que acredita que as masculinidades são construções sociais nas nossas megalópoles. Tradicionalmente, homens são fortes, destemidos, provedores, (heteros)sexualmente ativos, adoram esportes e nunca reclamam, pois são resolvedores de problemas. Entretanto, a ideia de que a masculinidade é tóxica e precisa ser consertada parece ter se tornado dominante. Nolasco descreve a representação social que o Brasil tem dos homens como tendo mudado de Tarzan (um homem forte, selvagem e independente) para Homer Simpson (um homem idiota, preguiçoso e bêbado, inútil sem sua esposa e filha superinteligente).
“Tal como a lei 11340/06 (lei Maria da Penha), a qual pune a violência doméstica, mas só se a vítima é mulher.”
As pessoas raramente questionam a ideia de que o Brasil é um dos países mais sexistas do mundo. A opressão das mulheres começa assim que escutamos as primeiras palavras porque, ao perder o gênero neutro, a língua portuguesa trata o gênero masculino como um gênero indefinido, quer dizer, se tu estiver falando de um grupo com ambos os sexos ou o sexo for desconhecido, você deve usar o gênero masculino e isso é, de acordo com feministas, machismo estrutural. Ainda mais sem sentido são as repetições de argumentos importados dos EUA e Reino Unido que são inadequados para o cenário brasileiro (ex.: mulheres tiveram que lutar pelo direito ao voto e trabalho. No Brasil, votar não é um direito, mas um dever, e não houve luta. As mulheres foram ativamente encorajadas a votar como parte de uma campanha política. Além disso, trabalho em português vem do latim tri palium, três paus, um instrumento de tortura, reforçando a ideia de que trabalhar é a punição de Adão por comer do fruto proibido e que trabalhar é o destino dos escravos).
Para emancipar as mulheres, leis e campanhas governamentais foram criadas para lutar contra a violência de gênero (por “violência de gênero”, entenda “qualquer coisa que possa ferir as mulheres, fisica ou emocionalmente”). Tal como a lei 11340/06 (lei Maria da Penha), a qual pune a violência doméstica, mas só se a vítima é mulher. Outra é a lei 13104/15 (lei do feminicídio), a qual deveria ser sobre homicídios cometidos contra mulheres “por serem mulheres”, mas, na prática, é usada sempre que uma mulher é morta, não importa se foi intencional ou acidental, se foi cometido por um homem ou mulher. Porém, quando os dados são apresentados nas mídias, sempre se assume que a mulher foi morta por homem (supostamente, um marido violento) só porque ele não suportava a independência da vítima.
“...violência contra homens é menos importante porque “são homens que matam outros homens” e que qualquer crítica contra tais leis são tentativas de promover violência contra mulheres. Nas universidades e na política, criticar tais leis pode ser suicídio profissional.”
Fora das universidades e da política, estas leis são constantemente criticadas e vistas como inconstitucionais. Críticos argumentam que tais leis se opõem ao Artigo 5 da Constituição Federal (“homens e mulheres são iguais em direitos e deveres”) e uma lei justa puniria qualquer tipo de violência doméstica assim como reconheceria que violência de gênero contra homens “só por serem homens”. Defensores clamam que a violência contra homens é menos importante porque “são homens que matam outros homens” e que qualquer crítica contra tais leis são tentativas de promover violência contra mulheres. Nas universidades e na política, criticar tais leis pode ser suicídio profissional. Um exemplo seria quando o juiz Gilvan Macêdo dos Santos publicou um livro intitulado A Discriminação do Gênero-Homem no Brasil em Face à Lei Maria da Penha, mas a publicação foi adiada em decorrência de ameaças e protestos retratando o livro como promotor de violência contra a mulher – apesar do livro ainda não ter sido publicado e, consequentemente, ninguém o tinha lido para saber se isso era verdade.
Esse episódio pode lembrar alguns de quando a apresentação do documentário The Red Pill [A pílula vermelha] no cinema Palace Kino foi cancelada. Falando de documentários, o Brasil tem seu próprio documentário sobre homens: O Silêncio dos Homens. O documentário promete ser “Um filme sobre as dores, qualidades, omissões e processos de mudança nos homens”.
Infelizmente, diferente do The Red Pill, o qual mostra os dois lados da moeda – os contra e os a favor do MDH - o Silêncio dos Homens começa com homens dizendo coisas como “Eu não deixava minha namorada dirigir. Eu tinha que dirigir, mesmo que eu estivesse bêbado” ou “meu pai nunca falou com a gente, exceto para bater”. Atitudes positivas são o resultado de adotar ideais feministas. Eu reconheço que os problemas apresentados são importantes, devem ser discutidos e são verdade em muitos casos. O problema, na minha opinião, é que o filme retrata estas situações como as únicas que existiam até agora. Todos os pais, avós e demais homens das gerações anteriores eram abusivos, violentos e emocionalmente distantes. Não há pai amoroso sem feminismo.
O filme fala das dores, omissões e processos de mudança de alguns homens, mas não diz nada sobre suas qualidades. Curiosamente, os mesmos profissionais que prometeram falar sobre as dores, qualidades, omissões e processos de mudança nos homens entrevistaram o Aldir Gracindo, o líder do MDH no Brasil, mas ele não aparece no filme, nem mesmo uma única vez.
“A Igreja prega que Deus é um pai, mas seu amor é maternal. O dia das mães é um dia para agradecer tua mãe pelo amor dela, enquanto o dia dos pais é um dia para criticar maus pais.”
Na última década, vimos um aumento no interesse pelas situações dos homens e meninos. Infelizmente, vieses gama e delta são a regra, não a exceção. Campanhas de saúde dizem que os próprios homens são culpados por morrerem mais cedo que as mulheres e precisam entrar em contato com suas fraquezas. A Educação trata os meninos como alunos problemas, que precisam ser medicados. Políticos falam dos homens como opressores, estupradores e agressores de esposas. A universidade e os meios de comunicação em massa “provam” que os homens são o problema com dados não falseáveis. A Igreja prega que Deus é um pai, mas seu amor é maternal. O dia das mães é um dia para agradecer tua mãe pelo amor dela, enquanto o dia dos pais é um dia para criticar maus pais.
Como eu disse no começo, o Brasil é plural e essa não é o único ponto de vista. Há quem ainda veja a masculinidade como um arquétipo de Tarzan que precisa ser resgatado. Há os MGTOWs (Men Going Their Own Way, Homens que seguem seu próprio caminho) e ADHs. Mas essas pessoas não são as que estão no poder (pelo menos, não ficam por muito tempo). Muitas pessoas (especialmente mulheres) criticam a masculinidade tradicional, mas a reforçam. Acho que Nolasco acertou quando disse que homens, no Brasil, são como Homer Simpson (e meninos como Bart). Ele pode não prestar, mas todos o amam.
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